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FRATURAS OSTEOPORÓTICAS: A epidemia silenciosa

As fraturas causadas pela osteoporose são já um enorme problema de saúde pública em Portugal!

E tenderá a aumentar exponencialmente se a comunidade médica, outros profissionais de saúde e a população em geral em conjunto com as autoridades regulatórias não determinarem a uma ação verdadeiramente enérgica.

Num estudo que publicámos em 2013[1] verificámos que ocorreram, só em Portugal continental, mais de 50.000 fraturas osteoporóticas do fémur proximal entre 2006 e 2010. A cada ano o número destas fraturas aumentou de 200 unidades, em média. Podemos assim fazer uma estimativa, otimista, de que sejam atualmente cerca de 13.000 a cada ano, isto é, uma a cada 40 minutos, se o aumento da longevidade não tiver agravado a realidade.

Cada uma cada uma destas fraturas determina o prejuízo acentuado da qualidade da vida das suas vítimas e acrescenta em 12% o risco absoluto de morte no ano subsequente, já elevado pela idade avançada. [2]

Estimámos, nesse artigo que, a custos de 2011, as fraturas do fémur proximal consumiam já anualmente 216 milhões de euros em custos diretos e indiretos, equivalente a 2,35% do orçamento geral para a saúde nesse ano.

As fraturas do fémur proximal são as mais fáceis de estudar, mas se representam apenas uma em cada 4 fraturas osteoporóticas: 50000 fraturas osteoporóticas a cada ano, neste pequeno país.

Um estudo internacional recente da International Osteoporosis Foundation estima que Portugal gastou 1003 milhões de euros em cerca de 70.000 fraturas osteoporóticas em 2019, representando 5,6% do total de gastos em saúde. Prevê que gastaremos muito mais em 86.000 fraturas em 2034, se nada de efetivo for feito. [3]

O aumento da incidência do fraturas tem sido relacionado com múltiplos fatores, entre os quais se destaca o notável acréscimo da longevidade da população. Trata-se, em boa medida, de um efeito secundário do progresso social e médico observado nas últimas décadas o que sublinha a nossa responsabilidade coletiva em dar qualidade aos anos que acrescentamos à vida.

Em Portugal, temos instrumentos capazes de diminuir drasticamente este avanço! Persiste, contudo, uma enorme discrepância entre o número de doentes que deveriam receber tratamento e aqueles que efetivamente o recebem, um pouco por todo o mundo.

Temos acesso fácil a medicamentos eficazes, capazes de reduzir o risco de fratura em 50 a 70%;

Temos um instrumento, FRAX® Portugal, que permite estimar o risco individual de fratura com excelente acuidade e, assim, selecionar adequadamente os principais candidatos a tratamento; [4] ( https://www.sheffield.ac.uk/FRAX/tool.aspx?lang=pr)

Temos recomendações multidisciplinares sobre quem tratar e quem estudar por densitometria; [5],[6]

Temos recomendações multidisciplinares sobre a orientação terapêutica mais adequada às diferentes circunstâncias clínicas, tendo em conta as especificidades nacionais ponto.[7]

Faltam-nos, contudo, 4 condimentos essenciais ao sucesso:

  • Uma política nacional que defina uma estratégia capaz de combater a epidemia das fraturas, no contexto de uma política que enquadre os prementíssimos problemas inerentes ao envelhecimento populacional;
  • Uma comunidade médica empenhada em levar à prática as recomendações de rastreio e tratamento em cada um dos seus doentes.
  • Um efetivo trabalho interdisciplinar que permita providenciar os melhores cuidados aos doentes.
  • Um maior envolvimento da sociedade em geral e das associações de doentes para aumentar a literacia nesta área.

Uma das maiores deficiências neste combate, destacadas em estudos internacionais, reside na falta de tratamento preventivo em pessoas que sofreram já uma fratura osteoporótica. É difícil imaginar mais claro sinal de alerta para a necessidade de iniciar uma terapêutica! A ocorrência de uma fratura é um forte sinal de que uma outra pode ocorrer num futuro próximo. O tratamento destes doentes, sem qualquer outra exigência, é advogado unanimemente em todas as recomendações sobre osteoporose.[8]

Apesar disso, em Portugal, como aliás no resto do mundo, são menos de 20% os doentes que estão a receber tratamento anti-osteoporótico um ano depois de sofrerem uma fratura!

Um número verdadeiramente lamentável, a todos os títulos, e que urge corrigir!

Cabe, naturalmente, à ortopedia e à medicina geral e familiar um papel especialmente importante e decisivo neste esforço. A reumatologia, que tradicionalmente abraça o tratamento da osteoporose em Portugal, tem também mantido um esforço continuado nesta área, através das recomendações e instrumentos acima referidos e ainda do lançamento de consultas de fraturas de fragilidade em vários hospitais do país. Estas estruturas, designadas internacionalmente por Fracture Liaison Services, são reconhecidas como o instrumento mais eficiente para garantir que pelo menos as pessoas que sofreram uma fratura recebem tratamento para evitar uma subsequente.

O combate à epidemia da osteoporose e das suas consequências não se limita, contudo, a nenhuma especialidade ou profissão, já que todos partilhamos responsabilidades gerais na saúde e todas as especialidades utilizam medicamentos, técnicas e recomendações que afetam a saúde músculo-esquelética dos indivíduos e da população.

Em nome da sustentabilidade do serviço nacional da saúde e da qualidade da saúde pública este é um desafio urgente, de que nenhum profissional de saúde se deve alhear.

[1] Andréa Marques, António Mota, …, Jonh Kanis, José António P. Da Silva. A FRAX model for the estimation of osteoporotic fracture probability in Portugal. Acta Reumatologica portuguesa 2013;38:104-112.

[2]  A. Marques, Ó. Lourenço & J. A. P. da Silva on Behalf of the Portuguese Working Group for the Study of the Burden of Hip Fractures in Portugal. The burden of osteoporotic hip fractures in Portugal: costs, health related quality of life and mortality. Osteoporos Int (2015) 26:2623–2630 DOI 10.1007/s00198-015-3171-5

[3] John A Kanis, Nicholas Norton, Nicholas C Harvey, Trolle Jacobson, Helena Johansson, Mattias Lorentzon, Eugene V McCloskey, Carl Willers, Fredrik Borgström. SCOPE 2021: a new scorecard for osteoporosis in Europe Arch Osteoporos. 2021 Jun 2;16(1):82. doi: 10.1007/s11657-020-00871-9.

[4] Andréa Marques, Raquel Lucas, Eugénia Simões, Suzanne M M Verstappen, Johannes W G Jacobs, Jose A P da Silva. Do we need bone mineral density to estimate osteoporotic fracture risk? A 10-year prospective multicentre validation study. RMD Open 2017;3:e000509. doi:10.1136/ rmdopen-2017-000509

[5] Andréa Marques, Óscar Lourenço, Gustaf Ortsäter, Fredrik Borgström, John A. Kanis, José António P. da Silva. Cost-effectiveness of intervention thresholds for the treatment of osteoporosis based on FRAX® in Portugal. Calcif Tissue Int 2016; 99:131–141.

[6] Marques A, Rodrigues AM, Romeu JC, JAP da Silva. Multidisciplinary Portuguese recommendations on DXA request and indication to treat in the prevention of fragility fractures. Acta Reumatol Port 2016;41:305-21.

[7] Rodrigues AM, Canhão H, Marques A, … da Silva JAP, on behalf of the Portuguese Society of Rheumatology. Portuguese recommendations for the prevention, diagnosis and management of primary osteoporosis – 2018 update. ACTA REUMATOL PORT. 2018;43:10-31

[8]  Vd https://www.capturethefracture.org/

Fonte/Original: https://healthnews.pt/2022/01/03/fraturas-osteoporoticas-a-epidemia-silenciosa/

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